terça-feira, 17 de novembro de 2009

A Vida

Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira...
Quando se vê, já terminou o ano...
Quando se vê, passaram-se 50 anos!
Agora, é tarde demais para ser reprovado...
Se me fosse dado, um dia, outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo
caminho, a casca dourada e inútil das horas...
Dessa forma eu digo:
Não deixe de fazer algo que gosta devido a falta
de tempo, a única falta que terá, será desse tempo
que infelizmente não voltará mais.

Mário Quintana

A Sunga do Thiago Lacerda

A 3ª turma do STJ, por unanimidade, acolheu parcialmente o pedido da TV SBT Canal 4 de São Paulo S/A e de Roberto Manzoni e reduziu para R$ 80 mil a indenização a ser paga ao ator Thiago Lacerda. O valor é referente à indenização por uso indevido da imagem do ator na realização do leilão de uma sunga de banho supostamente utilizada pelo artista ao interpretar Jesus Cristo na encenação da Paixão de Cristo, realizada em João Pessoa/PR.A defesa do ator ajuizou ação ordinária de indenização por uso indevido de imagem, dano material e dano moral contra a emissora de televisão, o diretor e o apresentador do programa Domingo Legal, Augusto Liberato. Na ação, alegou que em abril de 2000, o programa dominical voltou-se por completo, durante aproximadamente vinte e cinco minutos, para noticiar sua atuação na Paixão de Cristo e para leiloar a suposta sunga utilizada pelo ator na apresentação.Em 1ª instância, o pedido foi concedido em parte para condenar a emissora de televisão e o apresentador ao pagamento de R$ 140 mil por danos morais. O diretor foi condenado a pagar R$ 80 mil também por danos morais.A emissora e o diretor apelaram da sentença. O TJ/RJ negou a apelação ao entendimento de que o fato de alegarem que a arrecadação do leilão seria destinada a instituição de caridade não descaracteriza a ofensa ao direito do autor. Para o TJ/RJ, sendo um profissional de atividade artística, consagrado na mídia, sua imagem não pode ser utilizada, sem a sua concordância, como atração para aumentar a audiência de empresa com a qual não mantém vínculo contratual.Inconformados, eles recorreram ao STJ sustentando que não houve nenhum dano que justificasse a condenação ao pagamento da indenização estipulada, já que o resultado danoso é requisito essencial para o dever de indenizar. Por fim, pediram que a condenação fosse minorada para um patamar justo, tendo em vista que o STJ deve controlar o valor das indenizações extrapatrimoniais.Ao decidir, o relator, ministro Sidnei Beneti, destacou que o montante fixado mostra-se exagerado, extrapolando os limites definidos pela jurisprudência desta Casa. Assim, a indenização deve ser reduzida para o valor de R$ 40 mil para cada - emissora e diretor. Segundo o ministro, essa quantia cumpre, com razoabilidade, a sua dupla finalidade, isto é, a de punir pelo ato ilícito cometido e a de reparar a vítima pelo sofrimento moral experimentado, considerando o fato de que o ofendido era contratado de outra emissora e as peculiaridades da exposição da sua imagem.Fonte: Migalhas

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Decisão histórica do STF: fim da prisão civil do depositário infiel

O Império romano acabou com a prisão civil por dívida (excepcionando-se a de alimentos) no século V a.c., quando revogou a Lex Paetelia Papiria. Os romanos concluíram que a liberdade da pessoa não podia ser tolhida em função de dívidas. No Brasil, vinte e seis séculos depois, foi feita a mesma coisa: a histórica decisão do STF, de 3.12.08 (RE 466.343-SP), passou a constituir a certidão de óbito da prisão civil do depositário infiel. Nesse ponto o Brasil passou a observar os atuais padrões de civilização seguidos no mundo todo.Mas ao mesmo tempo a referida decisão também configura a certidão de nascimento de um novo modelo de Estado: o constitucional internacionalista (ou transnacional). Do Estado legalista (século XIX) passamos para o Estado constitucional (1945-1946: julgamentos de Nuremberg) e a partir de agora alcançamos o Estado constitucional internacionalista (3.12.08).O fim a prisão civil do depositário infiel: viraram pó (no Brasil) todas as hipóteses de prisão civil em razão de depósito (Pulvis es et in pulverem reverteris – És pó e a ele voltarás). Não interessa qual é o tipo de depósito (judicial, alienação fiduciária etc.). Nenhuma norma que cuida desse tipo de prisão civil continua válida. Acham-se vigentes, mas perderam a validade (Ferrajoli). Como assim?É que os tratados internacionais (Convenção Americana sobre Direitos Humanos, art. 7º, 7, e Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, art. 11) só permitem a prisão civil em caso de alimentos. Não autoriza nenhuma outra prisão civil por dívida. Essas normas valem mais que a legislação ordinária no Brasil. Qualquer outra com elas conflitante não vale. Por quê?Porque o STF reconheceu, finalmente (por cinco votos a quatro), o valor supralegal dos tratados de direitos humanos já vigentes no Brasil (RE 466.343-SP, j. 3.12.08). Dentro do STF havia (ultimamente) duas correntes (sobre o assunto): 1ª) a sustentada pelo Min. Gilmar Mendes, no sentido de que tais tratados possuem valor supralegal (acima da lei, mas abaixo da constituição) – RE 466.343-SP; 2ª) a defendida pelo Min. Celso de Mello que admitia o valor constitucional dos tratados (HC 87.585-TO). Preponderou a primeira tese (por cinco votos a quatro).Todos os tratados, então, contam apenas com valor supralegal? Não. Por força da EC 45/2004 foi agregado ao art. 5º da CF um novo parágrafo (§ 3º) que confere valor de Emenda Constitucional ao tratado que for aprovado com quorum qualificado: três quintos dos votos de cada Casa, em duas votações. Nenhum tratado no Brasil, até agora, foi aprovado com essa exigência. Logo, todos que já vigoram possuem valor supralegal (não constitucional).Se as normas dos tratados valem mais do que a lei, toda lei que conflita com eles não conta com validade. Não importa se se trata de lei anterior ou posterior ao tratado. Que isso significa? Significa que, a partir de agora, toda lei deve ter dupla compatibilidade vertical: com a constituição e com os tratados de direitos humanos. Qualquer antagonismo resolve-se pelo fim da validade da lei ordinária. O inferior cede em favor do superior.Temos que admitir, por conseguinte, uma nova pirâmide jurídica no nosso país: no patamar inferior está a lei, na posição intermediária estão os tratados de direitos humanos (aprovados sem o quorum qualificado do § 3º do art. 5º da CF) e no topo está a constituição. Já não basta (para se conhecer o Direito) dominar as leis e os códigos (Estado legalista). Doravante só é jurista pleno quem também conta com razoável intimidade com a constituição (Estado constitucional de Direito) assim como com os tratados de direitos humanos (Estado constitucional internacionalista).De qualquer modo, em matéria de direitos humanos quando os tratados internacionais conflitam com a constituição brasileira (esse é o caso da prisão civil do depositário infiel) a solução não pode ser buscada no princípio da hierarquia. Não funciona (no conflito entre os tratados e a constituição) a hierarquia, sim, o princípio pro homine, que significa o seguinte: sempre prepondera a norma mais favorável ao ser humano. Não importa a hierarquia da norma, sim o seu conteúdo. O mais favorável prevalece. Não há que se falar em revogação da norma constitucional que conflita com o tratado. Todas as normas continuam vigentes. Mas no caso concreto será aplicada a mais favorável.E a norma inferior (lei) que conflita com o tratado? Perde ou não tem validade, quando conflita com o tratado. É o que ocorreu com todas as leis que cuidam da prisão do depositário infiel no Brasil. Todas perderam sua validade. E se o legislador editar nova lei disciplinando o mesmo assunto? A lei não terá validade. E quando a lei inferior é mais ampla que os tratados? Aí vale sempre a lei mais ampla, por força do princípio pro homine.O Direito, como se vê, não se confunde com a lei. Ele começa com o constituinte e termina com a jurisprudência dos tribunais (nacionais e internacionais). A lei é uma parte desse oceano. Pode ser válida ou não: tudo depende da sua compatibilidade com as normas superiores (internacionais e constitucionais).Convenhamos: nenhum jurista no Brasil pode ignorar a histórica decisão do STF de 3.12.08: essa data tornou-se muito importante para nós. Não só porque acabou com a prisão civil do depositário infiel, senão, sobretudo, porque inaugurou um novo modelo de Estado, de Direito e de Justiça: o constitucional internacionalista.Isso implica que o juiz já não pode se contentar em conhecer apenas as leis e os códigos. Esse modelo de juiz (legalista positivista) está morto. Será cada vez mais reconhecido como jurássico (ou dinossáurico). O que se lamenta (em pleno século XXI) é que ele está morto mas não foi (ainda) sepultado! A atual (assim como as futuras gerações) conta com o dever de extirpar do nosso mundo jurídico esse juiz legalista. Marcação sob pressão nele, esse é o nosso desafio! O STF fez a parte dele. Todos os demais operadores jurídicos, agora, devem fazer a sua, posto que é assim que caminha a humanidade.(Por Luiz Flávio Gomes)